Justiça do trabalho considera discriminatória dispensa logo após ajuizamento de processo trabalhista.
A legislação trabalhista brasileira apresenta poucos limites para que empregadores demitam empregados. Para rescindir um contrato de trabalho, basta que a empresa comunique o colaborador da dispensa e pague as verbas rescisórias.
Portanto, trata-se de direito do empregador, que pode dispensar o funcionário sem necessidade de que apresente qualquer justificativa.
Por outro lado, a Constituição Federal em seu artigo 7°, inciso I, protege as relações de trabalho contra dispensa arbitrária. O direito do empregador de despedir sem motivo é limitado pelo princípio de proteção do emprego contra a demissão arbitrária.
Neste artigo trataremos da dispensa motivada pelo ajuizamento de processo trabalhista.
RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO POR ATO DISCRIMINATÓRIO
Além dos dispositivos constitucionais, em 1995 foi editada a Lei n° 9.029, que proíbe a exigência de atestados de gravidez e outras práticas discriminatórias para efeitos admissionais ou de permanência da relação jurídica de trabalho
O artigo 4° da Lei 9.029/95 estabelece que caso haja rescisão do contrato de trabalho por ato discriminatório o empregado poderá requerer:
1. a readmissão com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente, acrescidas dos juros legais;
ou
2. a percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais.
Apesar da Lei n° 9.029/95 proibir a dispensa discriminatória, a vedação é genérica, ou seja, não existem na legislação maiores explicações do que é discriminatório e do que não é.
Os casos que envolvem saúde são os mais comumente reconhecidos como discriminatórios, como por exemplo, a dispensa de colaboradores portadores do vírus HIV, trabalhadores com câncer ou outras doenças graves.
Nessas situações de dispensa, os juízes buscam provas de que o empregador conhecia o estado de saúde do empregado quando efetuou a demissão, para que fique comprovada a dispensa discriminatória.
Existem ainda casos de dispensa em virtude da opção sexual do colaborador, que são discriminatórias e, ainda pior, invadem a privacidade do trabalhador, causando-lhe danos materiais e morais.
DISPENSA EM VIRTUDE DE PROCESSO TRABALHISTA
O trabalhador que ingressa com uma ação trabalhista está exercendo seu direito constitucional de ação, pois, conforme prevê o Art. 5º, XXXV da CF/88, a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.
Porém, muitos empregadores não entendem dessa forma e logo após a notificação da ação trabalhista desligam o colaborador.
Cabe salientar que tal decisão não é admissível e pode trazer ainda maiores dificuldades na defesa da empresa, pois além responder a ação trabalhista que já está em curso, poderá também responder por danos morais.
DECISÃO JUDICIAL CONDENA EMPRESA DE MG
Apesar da legislação não especificar em quais casos a demissão é considerada discriminatória, a justiça do trabalho tem se posicionado no sentido de não admitir a dispensa realizada em virtude da proposição de ação trabalhista.
Recentemente, a Vara do Trabalho de Frutal/MG julgou um processo de dispensa discriminatória de empregados que foram demitidos logo depois do ajuizamento de processos trabalhistas.
A juíza Thaísa Santana Souza Schneider condenou a empresa com base na Lei nº 9.029/95, que combate a discriminação nas relações de trabalho, a indenizar sete trabalhadores dispensados ilegalmente.
Os autores do processo trabalhista ainda trabalhavam quando procuraram a justiça do trabalho, porém foram dispensados por justa causa logo após o ajuizamento das ações.
VERSÃO DA EMPRESA
A empresa alegou que os funcionários foram indisciplinados e insubordinados ao aplicar a demissão por justa causa, porém a decisão judicial afastou a demissão e reconheceu a rescisão do contrato de trabalho sem justa causa.
Diante das provas apresentadas no processo, a juíza não teve dúvida de que houve perseguição aos empregados. Ela apontou que o patrão tem a liberdade de contratar e dispensar pessoal.
Todavia, a lei veda a dispensa discriminatória, por motivo de retaliação pelo exercício do direito ao acesso à justiça pelo empregado.
“O empregado não pode sofrer perseguições no ambiente laborativo em razão de ter se socorrido do Judiciário, sob pena de malferir, ainda que por via oblíqua, o direito fundamental de acesso à justiça, impedindo que os empregados movam demandas contra os seus atuais patrões”, registrou na sentença, citando jurisprudência do TRT de Minas.
No presente caso, a julgadora condenou a empresa a pagar a remuneração de cada trabalhador de forma dobrada no período entre a dispensa por justa causa e o trânsito em julgado do processo, além disso, determinou ainda o pagamento de indenização por dano moral de R$ 2 mil para cada empregado.
ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO
Em 2016, o Tribunal Superior do Trabalho analisou a questão da dispensa discriminatória após ajuizamento de ação trabalhista em decisão exarada pelo ministro Alberto Bresciani.
No entendimento do TST, apesar de a Lei nº 9.029/95 se referir taxativamente à prática discriminatória motivada por sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, utiliza-se sua interpretação analógica nos casos de dispensa por ajuizamento de ação trabalhista, pois nessa situação há violação ao direito constitucional de ação.
Apesar de a lei considerar apenas algumas condutas como crime, o justiça do trabalho já se posicionou expressamente que é vedada “qualquer prática discriminatória” que limite o acesso ou a permanência no emprego.