Com o advento da pandemia e as medidas de isolamento e distanciamento social, a rotina dos brasileiros mudou e muitas coisas que antes eram feitas na rua passaram a ser entregues nas nossas portas. Refeições, compras de mercado, medicamentos, encomendas feitas pela internet, tudo passou a ser entregue no conforto de nossas residências.
E uma figura ganhou espaço em nossas vidas, os entregadores de aplicativos. Trabalhadores que se arriscam nas ruas para garantir que nossos lanches e refeições cheguem quentinhos. Mas, qual a figura dessas pessoas nas relações profissionais? São empregados das empresas ou profissionais autônomos? Quais os seus direitos e obrigações? Neste artigo, vamos desvendar um pouco mais dessa profissão.
Quem é considerado empregado
Trabalhador é qualquer pessoa que utilize a sua força de trabalho como forma de subsistência, mediante a execução de obras e serviços e recebendo uma contraprestação. Mas, para ser considerado empregado e, consequentemente, ser protegido pela CLT, o trabalhador deve preencher alguns requisitos, a saber:
– Ser pessoa física;
– Pessoalidade;
– Subordinação;
– Habitualidade;
– Onerosidade.
Em linhas gerais, ser pessoa física significa basicamente dizer que uma pessoa jurídica não pode ser considerada empregada de outra ou até mesmo de uma pessoa física. Por pessoalidade, entende-se a prestação das atividades pelo empregado, que não poderá delegar essa função a terceiro.
Ser subordinado, em termos jurídicos, significa que o empregado deve se sujeitar às ordens e determinações do seu empregador podendo, inclusive, ser fiscalizado e disciplinado (nas formas previstas em lei).
Habitualidade é a presença constante, dentro dos limites estabelecidos e ser parte das atividades normais e permanentes da empresa. Por fim, onerosidade é o pagamento da contraprestação pelas atividades desenvolvidas.
Entregador é empregado?
Como vimos, todos os requisitos devem estar presentes para que o trabalhador seja considerado empregado, não podendo nenhum deles ficar de fora.
No caso dos entregadores de aplicativo, a maioria das decisões judiciais vêm afirmando que não podem esses ser considerados empregados, pois a eles faltam os requisitos da subordinação e da habitualidade.
A falta de subordinação ocorre à medida que são os entregadores que determinam a sua área de atuação, não se sujeitando às regras da empresa. Já com relação à habitualidade, o que falta é uma obrigatoriedade de cumprimento de jornada, podendo os motoboys trabalharem nos dias e horários que desejarem, sem uma exigência de carga horária mínima ou de cumprimento de metas.
Diante da ausência desses requisitos, a Justiça entendeu que o serviço de entregador de aplicativo é de prestação de serviços autônomo.
Para a justiça “essa organização de trabalho é inovadora, por ser intermediada por tecnologia, e é muito útil para as demandas atuais da nossa sociedade. Trata-se de um modelo de negócio válido, prestado por trabalhadores autônomos.”
Mas, quais são os direitos dos entregadores diante desse cenário?
A verdade é que a questão ainda é controversa e também há julgados no sentido oposto, como o julgado do TRT-RO que afirma: “A demonstração de que os serviços prestados se revestiam dos requisitos elencados no artigo 3º da CLT, especialmente, ante a presença do elemento subordinação, faz sucumbir a tentativa patronal de desvirtuara realidade dos fatos mediante a confecção de contrato para prestação de serviço autônomo de motoboy, a exigir o reconhecimento do vínculo empregatício, especialmente, nas hipóteses em que os serviços prestados estão inseridos no contexto de atividade comercial lucrativa da contratante. A contratação de natureza civil deve ser interpretada como mero instrumento destinado a mascarar a realidade fática enfrentada pelo trabalhador no dia a dia de seu mister e que pede substância ao enfrentar prova convincente em sentido oposto às condições nele estipuladas.”
Dessa forma, o trabalhador que pretender a obtenção do reconhecimento do seu vínculo empregatício pode buscar a justiça laboral para a satisfação do seu direito. Entretanto, nunca é demais ressaltar que vai depender da análise do caso concreto, da presença dos requisitos que mencionamos acima e das provas que o trabalhador conseguir juntar.
Mas a verdade é que a vitória da maior empresa de delivery do Brasil em uma Ação Civil Pública leva a crer a maior tendência de que o trabalho de entregador de aplicativo seja considerado como de prestação de serviços.
Nesse caso, valem as regras livremente estipuladas pelas partes no referido contrato.